Os bancos cometem a repetição de cobranças de dívidas com frequência, chegando ao ponto de solicitarem o bloqueio de bens dos consumidores, que nada devem à instituição e, mesmo assim, acabam tendo as contas bancárias e outros bens penhorados.
A cobrança em duplicidade ocorre por falha de comunicação entre o banco
e os escritórios de advocacia terceirizados, que não são comunicados do
pagamento e, por isso, dão continuidade às cobranças, causando a penhora
de bens e outros dissabores, como a negativação do nome dos consumidores
nos cadastros de devedores.
Entretanto, tal prática é condenada pelo Código Civil, que traz previsão
de reparação em dobro do valor cobrado indevidamente, consoante previsto
em seu artigo 940, que segue:
"Art. 940. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte,
sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará
obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado
e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição."
No mesmo sentido, o Código de Defesa do Consumidor prescreve:
"Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto
a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.
Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à
repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso,
acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano
justificável.
Logo, a conduta de cobrar dívida já paga, rotineiramente praticada pelas
instituições financeira, leva à repetição do valor, bem como ao dever de
indenizar pelos danos causados, tal como ocorreu no caso a seguir retratado:
Orçamento por e-mail:
A autora requer a majoração da indenização por danos morais arbitrada,
que entendeu insuficiente, no caso concreto.
O réu, por sua vez, em razões genéricas e, na maior parte das vezes, dissociadas
da sentença atacada e do próprio objeto da ação, pugna pelo afastamento
de sua responsabilidade, ao argumento de que agira no exercício regular
de seu direito.
Acena com a inexistência de dano moral indenizável e requer, subsidiariamente,
a redução da indenização por danos morais, que entendeu elevada e desproporcional.
Os recursos foram processados, nos termos da lei.
É o relatório.
Depreende-se dos autos que o pedido inicial decorre de conduta ilícita do
réu ao, após o cumprimento de acordo realizado para quitação do crédito
que detinha em desfavor da autora, dEU causa ao prosseguimento de execução
de título extrajudicial anteriormente ajuizada, requerendo, inclusive, a
penhora de ativos financeiros e automóvel de propriedade daquela, o que
foi deferido e realizado em outubro de 2013, dois anos após a quitação total
da avença (fls. 17/53).
Daí se vê que a pretensão da instituição financeira em ter sua postura considerada
como exercício regular de direito beira ao absurdo, assim como as demais
ilações sobre "fato de terceiro", "pacta sunt servanda", "ato jurídico perfeito"
etc., que apenas demonstram sua incúria no que se refere aos seus mais mínimos
deveres como fornecedor de serviços, não só no que tange a evitar a lesão
de seus consumidores, mas sobretudo à respectiva obrigação de repará-las.
A responsabilidade da instituição financeira é patente e amplamente demonstrada
pelos documentos que acompanharam a petição inicial.
O mesmo se diga do dano moral experimentado pela autora, que a despeito
do cumprimento integral do acordo proposto pela própria ré, teve seus depósitos
bancários e automóvel penhorados.
Sabe-se que o dano moral decorre do simples fato da violação do direito
da vítima, que no caso é evidente.
Consoante lição de CARLOS ALBERTO BITTAR:
"Na concepção moderna da teoria da reparação de danos morais, prevalece,
de início, a orientação de que a responsabilização do agente se opera por
força do simples fato da violação. Com isso, verificado o evento danoso,
surge ipso facto, a necessidade de reparação, uma vez presentes os pressupostos
de direito". ("Reparação Civil por Danos Morais", p. 214, 3ª ed.)
Com relação ao valor da indenização, sabe-se que deve ser estabelecida em
importância que, dentro de um critério de prudência e razoabilidade, não
pode servir de fonte de enriquecimento da parte e tampouco inexpressiva
(RT 742/320,; RTJESP 137/187; JTJ-LEX 174/89).
A propósito do tema, manifestou-se o Superior Tribunal de Justiça:
"Embora a avaliação dos danos morais para fins indenizatórios seja das tarefas
mais difíceis impostas ao magistrado, cumpre-lhe atentar, em cada caso,
para as condições da vítima e do ofensor, o grau de dolo ou culpa presente
na espécie, bem como os prejuízos morais sofridos pela vítima, tendo em
conta a dupla finalidade da condenação, qual seja, a de punir o causador
do dano, de forma a desestimulá-lo à prática futura de atos semelhantes,
e a de compensar o sofrimento indevidamente imposto, evitando, sempre, que
o ressarcimento se transforme numa fonte de enriquecimento injustificado
ou que seja inexpressivo ao ponto de não retribuir o mal causado pela ofensa."
(AI nº 163.571-MG, Rel. Min. EDUARDO RIBEIRO, j. 9.2.99, DJU de 23.12.99,
p. 71)
Daí porque, observadas as circunstâncias do caso concreto e os objetivos
acima referidos, tal verba deve ser majorada para R$ 15.000,00 (quinze mil
reais), e corrigida conforme os critérios apontados na sentença.
Por esses fundamentos, reforma-se em parte a sentença apenas para majorar
a indenização por danos morais para o patamar acima explicitado.
Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso do réu e dou provimento
em parte ao recurso da autora.
PAULO ROBERTO DE SANTANA
Desembargador Relator"
No mesmo norte, vale transcrever:
"CONSUMIDOR. FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. BANCO. REENVIO DE FATURA JÁ PAGA.
REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PAGAMENTO DA SEGUNDA FATURA POR ENGANO. RESPONSABILIDADE
DA RÉ COMPROVADA. PRESENÇA DE REQUISITOS PARA RESTITUIÇÃO EM DOBRO. RECURSO
CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. O envio de boleto para pagamento de prestação
já quitada anteriormente, com recusa pelo banco de restituir administrativamente
e forma imediata quando comunicado pelo consumidor a informação do pagamento
indevido, configura defeito na prestação de serviço.
2.Logo, não há que se falar em ausência de responsabilidade e ato ilícito
uma vez que a empresa cobrou valor já pago pela recorrida, e ao receber
dois pagamentos não providenciou o estorno, ensejando a presente demanda.
3.Nos termos da jurisprudência desta Segunda Turma Recursal, é devida a
restituição na forma dobrada de valor indevidamente cobrado e pago. Inteligência
do parágrafo único do art. 42 do CDC. Precedente: (Acórdão n.892222, 20150710144285ACJ,
Relator: ARNALDO CORRÊA SILVA, 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais
do Distrito Federal, Data de Julgamento: 08/09/2015, publicado no DJE: 17/09/2015.
Pág. 247. Daniel Miranda Ribeiro X MRV Engenharia e Participações S/A) 4.No
caso, a empresa ré não se desincumbiu do ônus de comprovar a ausência de
responsabilidade muito menos a presença de engano justificável. Posto isto,
e configurada a má-fé, é devida a restituição do valor pago em excesso,
na forma dobrada. 5.Recurso CONHECIDO e NÃO PROVIDO. Custas e honorários
pela recorrente vencida, estes últimos fixados em 10% (dez por cento) da
condenação, nos termos do art. 55 da Lei 9.099/95. A súmula de julgamento
servirá como acórdão, consoante disposto no art. 46 da Lei 9.099/95." (TJ-DF
- ACJ: 20151010029156 , Relator: JOÃO LUIS FISCHER DIAS, Data de Julgamento:
29/09/2015, 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal,
Data de Publicação: Publicado no DJE : 06/10/2015 . Pág.: 386)
PROCESSO CIVIL. DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. REPETIÇÃO
EM DOBRO DE INDÉBITO. ART. 1.531 DO CÓDIGO CIVIL/1916. POSSIBILIDADE DE
REQUERIMENTO EM SEDE DE EMBARGOS. 1. A condenação ao pagamento em dobro
do valor indevidamente cobrado (art. 1.531 do Código Civil de 1916) prescinde
de reconvenção ou propositura de ação própria, podendo ser formulado em
qualquer via processual, sendo imprescindível a demonstração de má-fé do
credor.
Precedentes.
2. Recurso especial provido.
(REsp 1005939/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado
em 09/10/2012, DJe 31/10/2012)
Como demonstrado, a lei vigente traz previsão expressa penalizando a cobrança
por dívida já paga, não existindo justificativa para que os bancos perpetrarem
tal prática abusiva, sem que ocorra a devida indenização.
Autor: Héctor Luiz Borecki Carrillo advogado especializado em indenizações
contra grandes empresas.